Por que ainda se fala em “liderança feminina” e não apenas em liderança?

Juliana Albanez
Juliana Albanez

Uma das coisas que mais gosto de fazer é aproveitar as férias indo para a casa da minha avó. Lá posso ouvir suas histórias, seu mundo, suas dúvidas e perspectivas de futuro. Não sei por que, mas sempre tenho a impressão de que ela também quer conhecer questões do meu mundo. São trocas.

Em uma dessas trocas, ela quis saber com detalhes o que faço e do que eu falo em minhas palestras. Chamei sua atenção quando descrevi um pouco da minha fala sobre Liderança Feminina. Ativei suas memórias. Ela voltou à sua vida, voltamos ao século XX, década de 40, 50 e sobre o papel da mulher nesse contexto.

Ouvindo minha avó, percebi que, nem em seus melhores sonhos, ela poderia imaginar estarmos nós aonde chegamos hoje; tanto na carreira, nas escolhas, nas oportunidades, nos relacionamentos e na vida. Realmente temos muito a comemorar. De Cleópatra a Malala, a personalidades e estilos de liderança, o mundo viu como a mulher pode influenciar e ter seu lugar no mundo.

No entanto, quando colocamos a lupa, vimos que ainda temos muito que caminhar. Mesmo ocupando quase metade do mercado de trabalho, mais capacitadas, graduadas em maior número, nós ainda não só ganhamos menos, como também somos apenas 7,9%, no Brasil em cargos de liderança e conselhos administrativos.

Em outras palavras, somos muitas em força de trabalho, mas poucas decidindo os caminhos de nossa própria liderança.

Aquela velha pergunta, “O que você quer ser quando crescer?”, de certa forma até batida, pode revelar respostas importantes. Uma pesquisa nos Estados Unidos revelou que só os garotos responderam que queriam ser Presidente da República, ou diretor de uma grande empresa. Meninas ainda responderam profissões mais maternais e femininas, como professoras, enfermeiras e aeromoças.

Essa dúvida entre carreira e família, carreira e maternidade, nos acompanha de modo estigmatizado em vários momentos da vida. Desde a hora de aceitar ou não uma desejada promoção, assumir estar na vitrine, ao momento de aceitar os méritos de um elogio, de se colocar como gestora, de se preocupar com resultados e não sem ser a Miss Simpatia. Todas essas questões fazem parte da nossa rotina e coloca a todo instante nossa liderança em “xeque-mate”.

Voltando a minha vó, entre um biscoito e outro, ela me surpreendeu quando me perguntou: Mas vocês hoje, com tanta evidência e oportunidade, são mais felizes? Respirei, procurei um café enquanto pensava na resposta, e disse: “Definitivamente, não. Basta olharmos os números de antidepressivos, ansiolíticos direcionados a mulheres, e a busca e pressão perigosa pelo corpo ideal. Muita opção não é sinônima de felicidade.”. Mas essa pergunta não é simples de responder, porque nossos conceitos de felicidade são bem diferentes.

Experimente perguntar a um homem sobre sua trajetória, sobre o exercício de olhar pra trás e perceber se foi feliz ou não. Provavelmente ele vai analisar sua carreira, seu caminho, de onde partiu e aonde chegou e vai dizer sem rodeios, sim ou não a sua realização.

E nós, mulheres? Antes de responder essa pergunta, vamos olhar lá dentro, para nossas escolhas, nossos fracassos, nossas perdas, nossos ganhos, a família que construímos e onde toda essa história nos levou.

Mas a verdade é que não voltamos atrás. Esse é nosso mundo, nosso tempo, com todas as marcas, de tantas Malalas, Marias e Joanas que conquistaram vitórias importantes.  A primeira delas é o maior acesso ao nosso desenvolvimento, buscamos mais. E junto com essa busca, vem uma geração menos preconceituosa, mais aberta a oportunidades e que aceita melhor a ideia de mulheres em papéis de liderança.  Lares compartilhados, o fim da figura sisuda do “chefe de família”, homens e mulheres que cuidam dos filhos, que ajudam no jantar, que pagam as contas e tentam se adaptar a essa nova família, com novas realidades, novos homens e novas mulheres, sim, o processo de liderança feminina envolve toda a família.

Mas o principal, em minha opinião é o ato de libertação, de engavetamento do mito. De que não existe mãe, esposa, filha e mulher perfeita. Somos nossas escolhas e jamais teremos a resposta, o veredito da vida que fizemos a coisa certa.

E olhando a mesa de café, vi minha vó distraída dobrando o guardanapo. Percebi que queria mais tempo, mais tempo para sentir esse mundo que estamos vivendo e assistir mesmo que, como coadjuvante, todas essas mudanças e conquistas que tanto conversamos. Mal sabe ela que de coadjuvante não foi nada. Foi uma das tantas protagonistas de uma vida comum, na qual me espelho.

Sobre a autora:

Juliana Albanez é Personal & Professional Coach, palestrante e jornalista. Especialista em Comportamento, Liderança Feminina, Gestão Pública e Comunicação, Juliana já levou suas palestras, treinamentos e sessões de coaching para milhares de pessoas no Brasil inteiro. Suas apresentações já lhe renderam os mais positivos feedbacks, principalmente de pessoas que deram a volta por cima em suas vidas e carreiras, graças aos seus conceitos e ensinamentos.

Site: www.julianaalbanez.com.br

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