O Homem, o Trabalho e o Mundo do Trabalho – Sob uma perspectiva histórica

Ângelo Peres
Ângelo Peres

 Condenado a trabalhar para viver. 

                                                          (Moisés)  

 

O profissional de recursos humanos tem como desafio principal, conciliar às expectativas / interesses / desejos / vontades / sonhos tanto do dono da empresa (ou o acionista), bem como das pessoas: os trabalhadores. 

Este desafio é, em muitos casos, uma tarefa quase que impossível visto que, muitas das vezes, essas expectativas são distintas ou, em alguns casos, diametralmente opostas. 

O objetivo deste artigo é o de fazermos uma reflexão sobre o trabalho versus o trabalhador e de sua relação no mundo do trabalho, numa perspectiva histórica. 

Para iniciar esta reflexão devemos pontuar que o ser humano é o único ser vivo capaz de realizar sonhos, ou melhor, sonhar. Só para citarmos um: o sonho de voar. 

O homem não tem – em seu equipamento biológico – qualquer condição de voar. Porém, a partir de sua capacidade de sonhar e empreender, criou o avião e os outros instrumentos que possibilitam que o homem voe. 

Por outro lado, trabalho é um fazer do homem. Só o homem trabalha, de todas as espécies animais. Porém, por outro lado, alguns povos da Antigüidade tinham o trabalho como algo impuro, indigno e desprezível. O trabalho não era uma atividade digna do homem livre. Ou seja, cabia, mormente, aos escravos as tarefas diárias, ou melhor, o trabalho. 

A sociedade era dividida em animal laborans e o animal rationale. Acreditava-se, na época, que o animal laborans era, realmente, uma das espécies animais que viviam na Terra, na melhor das hipóteses a mais desenvolvida. 

Trabalho não é vergonha, é só uma maldição.  

                                                                                              (Guimarães Rosa)  

Se continuarmos progredindo na história, chegaremos à Idade Média. Lá o trabalho era visto como servidão. Onde os homens punham-se sob a proteção dos senhores da terra, prestando-lhes homenagens. È bom lembrar que a atividade produtiva era análoga às da Antigüidade Grega (ou Clássica). 

O que diferenciava uma da outra é que, na Idade Média, o trabalho era visto como um bem. Árduo, mas um bem1

O trabalho só vai receber um aspecto diferente e inovador com João Calvino2, que professa que o homem se salva, independentemente de suas obras. O homem deve viver o cristianismo no mundo através de uma moral rígida de simplicidade, trabalho e honestidade. 

Através da Reforma Protestante, Calvino prega que o sucesso no trabalho e nos negócios deverá ser, através de uma nova ética religiosa do trabalho. O Calvinismo revoluciona à medida que associa sucesso e trabalho com a benção divina. 

No século XVIII, Adam Smith, afirma que a riqueza não tinha origem no mercantilismo3, mas do trabalho. Com esta afirmação, Smith contraria os interesses do clero e da nobreza, que desprezavam o trabalho; e foi além, afirmou que para o trabalhador ter um pensamento mais ágil (para dar conta do processo produtivo) era necessário investir em educação básica para todos. 

Outra revolução, quanto à percepção do trabalho, é a encontrada em Karl Marx que identifica o trabalho não só como fonte de todo valor, mas principalmente o seu caráter social. 4 

Como se pode ver – neste “passeio” rápido pela história do Homem e sua relação com o Trabalho – a concepção de trabalho sofre muitas transformações (social, política, religiosa, econômica, etc.) através dos séculos, bem como o mundo sofre transformações de todas as ordens. 

O trabalho afasta de nós três grandes males: o tédio, o vício e a necessidade. 

                                                                                                                                         (Voltaire) 

Hoje, a nova ameaça do Homem é, de novo, o trabalho. Ou melhor, a falta dele. Com a globalização o mundo não tem mais fronteiras e os processos de trabalho estão em franca fase de mudança e reconceituação. 

A robótica e os demais fenômenos tecnológicos estão, outra vez, mudando a face do trabalho e do trabalhador. 

Nada me fascina mais do que o trabalho: posso permanecer horas a fio a contemplá-lo. 

                                                                                                                                              (Jerome K. Jerome) 

Exige-se do trabalhador moderno: flexibilidade, trabalho em equipe, polivalência, só para citar alguns. Um aluno que sai hoje da universidade, tem que ter a consciência que seu conhecimento – o adquirido nos bancos escolares – tem um alto grau de depreciação em função dos avanços freqüentes impostos pela tecnologia. Assim, é lícito raciocinar que os ciclos tecnológicos estão diminuindo significativamente, ano a ano, à medida que o homem avança na sua sede de transformar seus sonhos em realidade. 

Dessa forma, o paradigma moderno passa a ser: eficiência, eficácia e produtividade e sua relação custo/benefício. 

Esta é a exigência do mundo moderno para as organizações e para os homens. Quem não possuir determinadas habilidades e forte características atitudinais, tende a sofrer o revés do desemprego ou, no caso das empresas, a falência. 

Voltando a origem etmológica da palavra trabalho. Trabalho vem do latim vulgar tripalium, que era um instrumento formado por três paus aguçados, com o qual os agricultores batiam o trigo, as espigas de milho, o linho, para rasgá-los, enfiá-los, etc. Na maioria dos dicionários modernos, no entanto, a palavra tripalium (três paus) é atribuída a um instrumento de tortura utilizado pelos romanos a fim de subjugar os cristãos. 

Gosto de pensar que trabalho é a aplicação da energia do homem para o bem da humanidade. O homem, no trabalho, é capaz de modificar a própria natureza, colocando-a a serviço de todos nós. Assim, cabe a área de RH dignificar o homem e o trabalho e minimizar o que Gonzaguinha canta em tão bela canção o homem sem trabalho não tem honra. 

1 – São Tomás de Aquino, século XIII. 

2 – Século XVI 

3 – política econômica que norteava o comércio na época. 

4 – Teoria da Mais-Valia, século XIX. 

Sobre o autor: 

Angelo Peres é Mestre em Economia, Pós-graduado em Recursos Humanos, Marketing e Gestão Estratégica, Professor universitário, Palestrante e instrutor em programas de treinamento; Sócio-Gerente da P&P Consultores Associados.  

e-mail: ppconsul@unisys.com.br

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